Há muito se discute o significado de democracia plena e de respeito às instituições de direito. No Brasil moderno, essa discussão se acalora quando assistimos a inúmeras operações policiais – aquelas com nomes pitorescos – pra não falar enigmáticos – que ocorrem com sofisticada imponência e são noticiadas como verdadeiras ações justiceiras do Estado moderno brasileiro.
Mandados de busca, de apreensão, de prisão, invasões a escritórios de advocacia, pessoas levadas sob a custodia do Estado e em nome dele algemadas, expostas como verdadeiros troféus da “justiça”, para o aplauso do povo que a tudo assiste com ares prazerosos de um Estado eficaz e realizador.
Ocorre que tal fato não é novo, na Idade Média um bando de fanáticos patológicos – e loucos de todo gênero, empunhavam espadas caçando pessoas em nome da religião, que após sumário julgamento eram expostas, insultadas e sem qualquer direito de defesa executadas.
No Brasil do Estado Novo e dos anos de chumbo da ditadura militar, perseguições semelhantes também aconteciam, onde pessoas eram presas e subtraídas da sociedade, sem saber por qual acusação respondiam. Muitas delas jamais voltaram.
Receia-me, profundamente, que Estado Democrático que tanto seu bradou nas ruas tenha, de fato, se transformando num Estado de Polícia. Para nós, advogados, portanto formadores de opinião, é inconcebível que qualquer cidadão seja preso e recolhido apenas para prestar depoimento, como da mesma forma se mostra inconcebível a prisão fundada no vazio dos indícios de prova – provas que jamais se materializam, haja vista as reiteradas decisões dos tribunais que julgam pela ilegalidade do ato e os restitui à liberdade, apenas para satisfazer a sociedade que clama por justiça e igualdade ante a tantos jovens mortos pela violência sem fim.
Não se trata de defender a impunidade ou diminuir a potencialidade dos crimes em todas as suas esferas. É preciso garantir ao investigado, ao menos, seus direitos basilares do contraditório e da ampla e irrestrita defesa. Quero sim, como todos os brasileiros, que os infratores sejam levados a julgamento; quero que a polícia exerça sua função na captação do conjunto probatório, quero que ele seja julgado e sê culpado condenado, e quero mais, quero que cumpra realmente a sentença imposta pelo Estado, mas é preciso extirpar, de uma vez por todas, esse Estado de Polícia instalado, que sob as vestes de aparente legalidade fere preceitos constitucionais e despreza nossas garantias individuais.
A prisão no sistema brasileiro é a exceção e não a regra, que só se mostra eficiente e necessária em casos de significativa importância.
Um Estado que prefere a execração moral de alguém; a destruição da imagem; o desejo de que o outro se dê mal, só para que nós tenhamos o ilusório deleite de que tudo funciona bem; o prazer de ver alguém enxovalhado, humilhado para que notas de rodapé de jornais atestem, meses depois, sua inocência não é e nem nunca foi o Estado Democrático de Direito que aprendi a defender desde os bancos da Universidade, é em verdade um Estado de Polícia que nos deixa, a todos, muito mais pobres, mais sombrios, mais decadentes.
José Pedro Chebatt Junior
Advogado
Chebatt & Niklis Advogados atua nas mais diversas áreas do direito e conta com uma completa estrutura administrativa e tecnológica, além de uma grande experiência que liga seu nome há mais de 30 anos no exercício da advocacia em Guarulhos.