O uso Indevido das Algemas e suas Consequências

O uso Indevido das Algemas e suas Consequências

É recente a decisão do Supremo Tribunal Federal – nossa Corte Maior, que disciplinou o uso das algemas pela policia. A decisão, por unanimidade, concedeu habeas corpus anulando a decisão tomada por um tribunal do júri que manteve o acusado algemado durante todo o julgamento, e o STF foi além, sumulando a utilização das algemas no país, posto que apenas a normatização do tema não foi suficiente para ordenar a polícia que agora afronta até as decisões da Maior Corte do país, quando ignora sua orientação.

A grita é geral e não é sem razão. A muito se observa o abuso no uso de tal instrumento pela polícia em suas diversas operações, e justificativas não faltam, indo desde a observância ao manual interno até normas internacionais da ICAO-OACI – Organização de Aviação Civil Internacional, no tocante a transporte de presos em aeronaves – como aconteceu com o ex-presidente do Senado, Sen. Jader Barbalho. Mas todas as regras do ordenamento jurídico interno ou internacional só possuem validade na medida em que se compatibilizam com a Constituição Federal, portanto a justificativa é vazia, afronta o estado democrático, os preceitos de legalidade, bem como afronta toda a comunidade jurídica, e merece reclamo.

Ante a tamanha ilegalidade, inclusive contrariando orientação do próprio STF, adveio a súmula vinculante, que sanciona severamente a autoridade que não observar a real necessidade para o uso das algemas. Na decisão, que veio em resposta a operação Dupla Face, onde 32 acusados foram algemados, os Ministros do Supremo entenderam que a ação foi um exemplo de afronta ao Tribunal, e de fato o foi na medida em que se ignoram decisões e orientações dos poderes já constituídos.

É relevante que para se justificar o uso das algemas haja o perigo iminente de fuga, de resistência à ordem de prisão, ou mesmo de danos a terceiros ou aos próprios policiais que cumprem a ordem. O que nós vemos, comumente, é que o uso tem como pano de fundo a degradação moral, a exposição ridicularizada da pessoa detida.

O ato policial de algemar quem voluntariamente se deixa conduzir preso afronta, acima de tudo, a dignidade da pessoa humana, e constitui ato de profunda reprovação, não merecendo àquele que proporciona o abuso outro destino que não o de arcar gravemente com as conseqüências de seus atos. De outra forma, viveremos em constante desmando, nessa terra de ninguém entre o direito público e o fato, entre a ordem jurídica e a dignidade.

É nesse liame de legalidade, ou ilegalidade, que se põe em xeque o verdadeiro Estado-Nação, que se diz Democrático de Direito.

José Pedro Chebatt Junior
Advogado